quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

É a maior conquista desse homem e ele chora como um bebê...

É a maior conquista desse homem e ele chora como um bebê. No meio de uma sala, praticamente toda a área do apartamento, de igual tamanho ao quarto de família que abandonou, ele chora sem postura. Chora com as costas arcadas e a cada lágrima entorta mais as pernas, sentido chão. Ele todo é um declive, uma parábola, um gráfico em decadência, um carro passa rente ao homem. Ele quase morreu e não ia se dar conta. Cada passo do homem é lento e toda a vontade dele é ir para trás, mesmo que sua casa fique em frente. Sua coluna torta o projeta adiante, mas uma corcunda é ironia: coloca qualquer face pra frente, mas diminui o tamanho do corpo. A corcunda era o reflexo da busca deste homem pelo decadente. O fracasso era a meta e quanto mais próximo da meta, mais distante da realização. Sentimentos antagônicos e por isso no meio da sala o homem curvou os joelhos: sua coluna atingiu o máximo que podia da corcunda, a meta de fracasso só teria sucesso ao se dobrar no chão. O choro é conseqüência, grito de glória, desespero de não saber o que quer quando atinge o almejado, barulho sujo de uma fechadura velha. Quando o homem coloca a chave na porta, sente o sucesso da empreitada. O fracasso está lá dentro e por isso o homem joga todas as suas roupas numa caixa de papelão. Não há ordem, há pressa. Quer sair da casa de sua família o quando antes, agora, já! Sua mãe alerta que há dois caminhos e uma escolha. Um dos caminhos é o natural e para ele já estava traçado, bastava trilhar, mas há sempre a escolha. Se optasse pelo outro, as pedras iam atrapalhar muito e as roupas tornaram-se pedras e todas são postas na caixa, sem ordem, com pressa. O homem fecha a caixa e com ela nas costas sai do quarto, sai da casa, ganha a rua e anda em frente, a caminho do fundo. A cada metro que anda a caixa ganha peso e as costas se curvam mais, cicatriz interna da sua trilha. Se o caminho tem pedras para atrapalhar, óbvio que não seriam obstáculos, e sim fardos, mas valente foi o homem que se arriscou, mesmo sem ter nobre intento. A chave quebra dentro da fechadura da porta, mas um chute basta para fazer as vezes do chaveiro. O apartamento é amarelo sujo e marrom velho, combinando, e muito, com a caixa de papelão que o homem arrasta para dentro. Segurar a caixa pelas bordas e arrastar é tarefa fácil para quem tem a coluna torta como ferradura. Uma vez que ambos, homem e caixa, estão prostrados no meio da sala, basta ao homem chorar a desgraça e o sucesso. O fracassado, como ele mesmo de adjetivou um dia desses, teve êxito no seu empenho. Prova disso é que chora como um feto no chão do seu apartamento.

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